30/03/2009

Ciência, tecnologia, mercantilismo e tempo

Continuando a série sobre o curso da FGV, segue mais uma reflexão...

Bem, levando em conta o que está sendo construído nesse espaço e as leituras do módulo, começo a fazer alguns apontamentos sobre as reflexões que me causaram.

Fiquei pensando muito sobre o domínio da economia sobre as outras esferas em tempos pós revolução-industrial e de revolução tecnológica. Numa primeira análise, acho que a relação mercantil com a ciência, nos dias de hoje, é certa e acho difícil mudarmos isso num médio prazo, por isso, sempre fico pensando que o debate é sobre o papel do Estado (e portanto dos governos brasileiros) nesse processo. Para discutirmos isso, como coletivo social, precisaríamos pensar, refletir e negociar quais são as prioridades da nação brasileira, qual nosso projeto de nação. A partir daí, conseguimos agir para exigir, transformar e adaptar nossos governos.

Em muitas universidades públicas ou privadas, por exemplo, temos empresas financiando salas ou grupos de pesquisa. Isso, naturalmente, direciona a ciência para resultados esperados por essas empresas. Isso é um problema? Não, se não for só isso o que ocorrer. Quer dizer, se o governo entender que as empresas desempenham o papel de financiar a pesquisa mais imediatista e voltada a interesses diretos e disponibilizar verbas e projetos para outras formas de pesquisa e desenvolvimento, não teremos um único caminho de pesquisa para o país.

Agora, enquanto tivermos um projeto neo-liberalizante de governança, teremos o ensino e a pesquisa voltados para resultados imediatistas e mercantis.

Um dos textos da unidade 2 traz um dado interessante para contrapor essa visão imediatista e “focada” da pesquisa. Falando sobre o surgimento da internet etc., a jorbalista Cora Rónai explica que quem percebeu a potencialidade da relação homem-computador não foi um dos pesquisadores dedicados diariamente a desenvolver as grandes máquinas de calcular da época, mas sim o psicólogo Joseph Carl Robnett Licklider, “de tanto brincar com elas como não-especialista, Lick foi a primeira pessoa a intuir que, um dia, aqueles mostrengos poderiam se transformar em extensões do cérebro humano. Em 1960, publicou as suas idéias sobre o assunto em Simbiose Homem-Computador – e nada foi mais como antes”. (RÓNAI)

“Marc Andreessen, que criou o Mosaic, e depois o Netscape, a partir do protótipo de browser do CERN, foi o primeiro milionário com fama de pop star da rede. Mas Tim Berners-Lee, o discreto gênio de Genebra, hoje no MIT, não se arrepende de não ter patenteado a sua invenção. Ele prefere a sensação de realização que sente ao ver a Web crescendo sem barreiras a uma montanha de dinheiro no banco”. (RÓNAI)

O texto de Profetas e Patinetes de Luiz Fernando Verissimo, apresentado no material da unidade 2, nos faz refletir sobre como “endeusamos” os cientistas, buscando neles as respostas para o futuro ou para nossas angústias epocais. Uma das características filosofia de Nietzsche era exatamente apontar a existência no tempo presente. A partir daí, tanto a filosofia como a ciência e outras áreas do conhecimento começaram a se permitir arriscar teorias e palpites sobre os movimentos, acontecimentos e fenômenos do presente. Escrevo arriscar, porque falar do presente certamente é recair em erros. Uma ciência do passado analisa fatos já ocorridos e, portanto, mais estanques e refletidos. Uma ciência do futuro só será compreendida no futuro e, portanto, avaliada no futuro e o futuro é o tempo por vir e portanto, não existe na conjuntura atual. Uma ciência do presente necessariamente analisa fatos e verdades ainda mais efêmeras. Com as Revoluções Industrial e Tecnológica o tempo presente é cada vez mais “rápido” e suas transformações e efemeridades também. Assim, uma ciência que busque se aplicar ao presente precisa necessariamente se adaptar a essa velocidade, mas sem deixar de lado a crítica ao “apertamento” do tempo. Quer dizer, precisamos nos relacionar com o tempo de maneira positivia, não podemos mudá-lo, mas podemos sim, mudar nossa perspectivas sobre o tempo necessário para determinada atividade ou comprovação. Não mudaremos o tempo, mas podemos mudar os paradigmas de nossa relação com ele.

Bibliografia:

RÓNAI, Cora. Internet, a informação franqueada. O Globo. Rio de Janeiro, n. 33, 1999. Globo 2000, p. 770-771.

VERISSIMO, Luiz Fernando. Profetas e patinetes. O Globo. Rio de Janeiro, 15 out. 2000. Opinião, p. 7.

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